A Dra. Flavia Piovesan, autoridade na área de Direitos Humanos, em artigo publicado no site da ONU, destaca que o Brasil é um dos países com maior utilização das redes sociais. Passamos uma boa parte do nosso tempo na internet compartilhando uma série de informações, fotos, vídeos, memes e outros tipos de postagens que circulam livremente na web. ⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀
Dificilmente nos questionamos sobre o conteúdo que estamos consumindo ou propagando, principalmente quando envolve a imagem de outras pessoas em formato de humor ou crítica ou, alguma vez, você já parou para refletir sobre as seguintes perguntas antes de repassar ou curtir um conteúdo que contenha foto ou vídeo de pessoas reais: ⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀
- Será que a pessoa que está nesse vídeo ou foto autorizou o uso de sua imagem? ⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀
- Será que posso compartilhar esse conteúdo pessoal, com o rosto do outro em exposição, sem nenhuma restrição?
- E se fosse eu no lugar dessa pessoa, como eu me sentiria ao me ver exposto?
Então, com base nessas reflexões, vamos explicar o que são os Direitos Humanos Digitais. A Constituição Federal de 1988, inclui em seu rol de Direitos Fundamentais (Art. 5°, X, CF) o direito à privacidade que garante a inviolabilidade da intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas.
Os Direitos Humanos Digitais tutelam a proteção dos direitos de imagem no ambiente virtual, principalmente com as questões de “cyberbullying”, “porn revenge” e outras modalidades de exposição vexatória de imagem privada.
Falaremos em outra oportunidade sobre o “cyberbullying”, mas hoje nos deteremos à observação do compartilhamento de memes com “imagens-retrato” no ambiente virtual.
As “imagens-retrato” são aquelas que mostram a identidade da pessoa, a sua forma física, o seu rosto, voz e individualidade. O conceito de “imagem-retrato” é um conceito constitucional que está contido no Art. 5º, inciso X, da Constituição Federal de 1988. Neste texto, falaremos somente sobre a publicação deste tipo de mídia que expõe a imagem pessoal de um individuo.
Os Memes são imagens, frases ou vídeos que normalmente viralizam nas redes sociais por apresentarem um conteúdo de humor, ironia ou sarcasmo. Todos nós já compartilhamos este tipo de conteúdo e isto é um fato. Então, qual é o problema em curtir e compartilhar memes?
O problema é que esses memes utilizam fotos e vídeos que são, em sua maioria, de pessoas que não autorizaram expressamente o uso de sua imagem que acaba sendo exposta para uma infinidade de outras pessoas desconhecidas em todo o mundo. O alcance da internet é infinito e retirar uma imagem da web, depois de já ter sido publicado, é uma tarefa muito difícil.
Nesses casos de exposição, o Código Civil protege o direito à imagem e assegura ao ofendido o direito de requerer a reparação do dano, inclusive com pedido de indenização pela exposição indevida, e a retirada do conteúdo da página em que está armazenado.
Ainda, corroborando este entendimento, o Superior Tribunal de Justiça editou a súmula 403, que assegura a indenização pela publicação não autorizada da imagem de pessoa, independente de prova do prejuízo.
Convém ressaltar que, mesmo que a imagem ou vídeo esteja em modo público, não é permitido o compartilhamento e a manipulação daquela mídia (transformação em memes de humor) sem a autorização do titular, ainda mais se aquela imagem estiver circulando com um intuito depreciativo e vexatório em relação à pessoa ou atividade exercida.
Daí você se pergunta: – mas mesmo se a “imagem-retrato” ou vídeo estiver em modo público? Isso por si só não é uma autorização tácita do titular? Não, não é. Os tribunais têm entendido que a autorização para a utilização da “imagem-retrato” deve ser expressa e, por se tratar de direito personalíssimo, a disponibilização da imagem ou vídeo de forma pública na internet, nas redes sociais do titular, não corresponde à cessão do direito de uso dessas mídias.
Por fim, é importante ressaltar que o direito à imagem, por ser um direito personalíssimo, é irrenunciável e intransmissível, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária, ressalvadas as exceções previstas em lei.
Então, reflita antes dar atenção a conteúdos claramente agressivos e humilhantes que contenha fotos pessoais de desconhecidos em situações sarcasmo ou humor, ou com violação da privacidade, no caso de “nudes”, não só por uma questão de vedação legal, mas sobretudo por empatia com o outro, que é um ser humano igual a você.
- Sobre a autora: Gerlusa Rocha é advogada, especialista em Direito do Consumidor e Direitos Fundamentais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, escritora por amor e possui especial interesse em escrita criativa, Direitos Digitais, Direitos Humanos e os possíveis diálogos com os novos contextos tecnológicos.
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