Ricardo Freire, além de tecnovester, é comunicador científico e youtuber. Ele possui mestrado em engenharia aeroespacial na Universidade de Roma “La Sapienza”, na Itália e graduação no Instituto Militar de Engenharia (IME). Foi aceito para um Ph.D. em engenharia aeroespacial na Georgia Tech, nos Estados Unidos. Ricardo é um dos engenheiros responsáveis pelo cálculo de manobras do satélite brasileiro SGDC e gerente técnico de diversões projetos de sistemas espaciais do Ministério da Defesa brasileiro. Além disso, criou o canal de divulgação científica sobre engenharia aeroespacial no YouTube chamado Um Pequeno Passo.
1. Quando você começou a se interessar pelo espaço e como os adultos à sua volta lidaram com essa curiosidade?
Gosto de espaço desde sempre, quando era criança já acompanhava as missões da NASA, lançamentos dos ônibus espaciais, etc. Quando surgiu a oportunidade de trabalhar na parte espacial aqui no Brasil, vi que era a minha chance de trabalhar com o que sempre gostei. Todos sempre tem bastante curiosidade para saber coisas sobre espaço e eu sempre gosto muito de tirar todas as dúvidas.
2. Em que momento você decidiu dedicar-se academicamente ao assunto?
Logo após concluir a minha graduação, fui trabalhar no Centro de Operações Espaciais (FAB) na parte espacial. Fiz muitos cursos e treinamentos, inclusive em instituições renomadas do setor aeroespacial brasileiro como no ITA e no INPE. Porém, sempre senti a necessidade de ter uma base acadêmica para me ajudar no trabalho, daí busquei fazer o mestrado em engenharia aeroespacial e agora o doutorado.
3. Quais são suas áreas de expertise ou de maior interesse e porquê?
Trabalho na parte de manobras orbitais, monitoramento do clima espacial e análises de colisão de objetos no espaço. Na época de criação do Centro de Operações Espaciais (COPE) eu tive a oportunidade de escolher onde eu iria trabalhar (na operação do satélite SGDC). Na época eu tinha me interessado bastante nas atividades de manobras do satélite e monitoramento do clima espacial, poucas pessoas no COPE se interessaram por isso, daí comecei nessa área e fui me especializando nela. São áreas de pesquisa e trabalho complexas, sempre tive interesse em resolver problemas complexos.
4. Porque se deve investir em tecnologias espaciais se ainda o saneamento básico no Brasil é tão precário?
O desenvolvimento da tecnologia espacial reflete em um ganho e crescimento altíssimo de tecnologias usadas na Terra. Muitas delas já se tornaram ferramentas essenciais do dia a dia das pessoas em todo o mundo. Sem o desenvolvimento da tecnologia espacial, por exemplo, não teríamos o GPS. Difícil imaginar como seria a vida sem um sistema desses atualmente. A tecnologia espacial movimenta bilhões de dólares todo ano e tem crescido significativamente a cada ano. É algo essencial para um país que quer crescer e ganhar autonomia tecnológica.
5. Dentro dos avanços alcançados na engenharia aeroespacial nos últimos anos, quais você considera mais impressionantes?
Pra mim a chegada do homem na Lua, no programa Apollo, foi o maior feito da engenharia aeroespacial de todos os tempos, principalmente, devido às limitações tecnológicas da época. As chances da missão Apollo 8, por exemplo, que foi a primeira vez que astronautas entraram na órbita da Lua, tinha uma chance de sucesso próximo de 50%, que é muito baixo, considerando o risco para os astronautas, mesmo assim eles assumiram o risco e a missão foi um sucesso. Além do programa Apollo, a construção da Estação Espacial Internacional, o ônibus espacial, missões para Marte e a reutilização de forma operacional dos foguetes da SpaceX eu considero como outras conquistas marcantes na história da exploração espacial.
6. Como empresas brasileiras o Brasil pode se tornar competitivas do setor?
As empresas brasileiras tem um potencial muito grande para se inserir no setor aeroespacial mundial, porém é essencial o apoio do governo no investimento para o desenvolvimento da indústria nacional. Algo semelhante ao que foi feito com a Embraer, mas ainda há pouco investimento e interesse do governo e do público nessa área espacial.
7. Como cientistas, professores e políticos brasileiros podem trabalhar para que nos próximos 10 anos o Brasil seja mais desenvolvido nessa área?
Planos para o desenvolvimento nacional do setor aeroespacial existem vários. O caminho é simples: capacitar os engenheiros e centros de pesquisa nacionais/universidades, fortalecer a indústria nacional e viabilizar a sustentabilidade do setor. Mas para isso acontecer precisa de apoio político e investimento do governo.
8. Como seus estudos independentes e dentro das universidades te ajudaram a compreender maior o universo em que vivemos?
O estudo acadêmico da física e da engenharia me ajudaram bastante a entender como diversos fenômenos físicos acontecem, inclusive me ajudam a realizar os procedimentos de operação do satélite com mais segurança.
9. Porque há uma fuga de cérebros no Brasil e porque você decidiu estudar fora?
O setor espacial no Brasil ainda tem muito para se desenvolver e, infelizmente, ainda está bem atrasado com relação a vários outros países do mundo. Tinha interesse em dar continuidade na minha formação acadêmica, no caso o doutorado (Ph.D.), e aqui no Brasil não tem nenhuma universidade que oferece o doutorado em engenharia aeroespacial, então decidi fazer em outro país referência em tecnologia espacial, no meu caso os Estados Unidos.