Dominguinhos cantava assim (Xote das meninas)…
De manhã cedo já tá pintada
Só vive suspirando, sonhando acordada
O pai leva ao doutor a filha adoentada
Não come, nem estuda, não dorme, não quer nada
Ela só quer
Só pensa em namorar
Ela só quer
Só pensa em namorar
Mas o doutor nem examina
Chamando o pai do lado, lhe diz logo em surdina
Que o mal é da idade e que pra tal menina
Não tem um só remédio em toda medicina
O adolescente é uma categoria geracional historicamente desassistida, pensada sempre por meio da pergunta: “o que você vai ser quando crescer?” em vez de “o que você é hoje? E ainda tem fama de inconsequente, desobediente, desengonçado, tedioso, erotizado, enfurnado no quarto, mais suscetíveis às drogas (cigarro eletrônico, cigarro comum, álcool, maconha…). Muitas pessoas dão como certo que a causa é dos “hormônios aumentados” (“o mal é da idade”). Não é bem isso que acontece…
O certo é que o cérebro sofre mudanças consideradas radicais por volta dos 14, 15 anos. Três dessas transformações respondem muita coisa: o circuito de recompensa, o mapeamento corporal e o desenvolvimento do pré-frontal.
O sistema límbico está ligado ao sistema de recompensa do cérebro. Pois é. Acontece que esse sistema perde diversos receptores para neurotransmissores como a dopamina e a serotonina. Isso espatifa o conceito de prazer conhecido na infância. É aí que surge comentários dos pais (que bem conheço como coordenador pedagógico): “não reconheço mais meu filho”, “ela nunca tinha dado trabalho”, “ele era tão família e só quer saber do celular e dos amigos”. Tudo certo até aqui, ao menos existe uma explicação científica para esse comportamento. Os estímulos do passado não fazem tanto sentido porque não desencadeiam motivação (sensação da antecipação da recompensa). Eles precisam de novos estímulos! Fora de casa… ou em ambiente virtual. A fase é dos amigos! Adolescente, esse intrépido ser que procura incansavelmente por estímulos. Insaciável! Enquanto não há estímulos interessantes, ele pratica o tédio (que tem o seu valor!).
“Meu corpo mudou!!! Eu não sou mais eu!” Com a fase do crescimento em apogeu, o corpo se modifica sob a batuta hormonal do GH (“growth hormone” ou hormônio do crescimento). Um corpo mudando em tamanho e genitalizando resulta em uma confusão cerebral! Um novo mapeamento corporal deve ser realizado pelo cérebro. Até que se reajuste é feito o corpo muda novamente! Olhar no espelho ajuda nessa reconfiguração (eles gostam de espelho, né?).
O difícil percurso até a maturidade do córtex pré-frontal. Sim! O cérebro ao chegar à adolescência já está definido em tamanho e neurônios. No entanto, há todo um arranjo que deve ocorrer com mudança na proporção entre massa cinzenta e massa branca que vai dando contornos definitivos para um cérebro adulto. A última área a desenvolver (isso ocorre entre 18 e 19 anos – idade em que muitos países, como o Brasil, define como maioridade penal) é o córtex pré-frontal que fica bem na testa. Essa área é complexa e muito importante. Está ligada com planejamento, com previsibilidade de consequências e possíveis arrependimentos, tomada de decisão, autocrítica, autocensura.
Caramba! Peraí! Os adolescentes são desastrados, não conseguem avaliar riscos e ainda são propensos a assumir riscos?
Não exageremos… Essa fase maravilhosa do nosso desenvolvimento (aquela que eu mais gosto como educador!) representa uma passagem extremamente rica. Nessa fase, eles se interessam por diversos assuntos que absolutamente não fazem sentido para a maioria das crianças como aprendizagem que exigem pensamento abstrato (filosofia e política), apreciam músicas que enfrentam o sistema, moda própria, cabelos próprios, tatuagens, querem independência (ao menos no sentido cognitivo e moral), querem amar. Nesse sentido, as escolas devem procurar oferecer estímulos para esses caçadores, fominhas de dopamina! Debates, música, dança, teatro, pensamento crítico, esportes, feiras, ações sociais, viagens.
Vamos escolas! Façamos a nossa parte!