A recente flexibilização do mercado de trabalho é resultado de um deliberada política de desmantelamento das conquistas sociais dos seguimentos mais vulneráveis da nossa população: os pobres. Quem precisa de emprego não o faz para criar um fardo para o empresário, mas porque precisa de dinheiro para viver e porque o Estado lhe deve satisfação devido aos longos anos de pagamento de impostos.
Os aeroportos que são usados pelos ricos, foram pagos com os mesmos impostos que são pagos pelos empregados que vão “ensardinhados” dentro dos ônibus às 6 da manhã para seus longínquos locais de trabalho.
A CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) foi uma conquista de anos de luta dos trabalhadores por melhores condições laborais. Ou você acha mesmo que se não fosse luta dos operários os empresários da I Revolução Industrial não teriam mantido crianças nas minas de carvão ou os homens de negócio da II Revolução Industrial não economizariam com equipamentos de proteção individual para seus funcionários ou, na atualidade, os proprietários do meio de produção não continuariam se referindo às empregadas domésticas “como se fossem parte da família”?
Tanto o Decreto-Lei nº 5.452/1943 quanto a Lei Complementar 150/2015 não passaram a existir por simples benevolência do Legislador, mas por necessidade de um povo que no seu âmago ainda não superou a herança maldita da escravidão e que tem uma salário mínimo irrisoriamente baixo se comparado ao que foi preconizado pela Constituição Federal que, por enquanto, ainda continua válida.
O trabalhador autônomo, de maneira geral, não decidiu ser empresário e não está empreendendo por que teve uma ideia inovadora, ele é um mascate ou vendedor de porta em porta e a romantização da pobreza prejudica o nosso desenvolvimento como sociedade. A “pejotização” das relações de trabalho ocorrer para burlar o que preconiza a lei e aumentar o fardo que recai sobre a parte mais vulnerável da relação de trabalho.
Ora, pois, querido Douglas, a relação de trabalho se constitui vínculo empregatício, de acordo com o artigo 3º da CLT, a relação da empresa com a PESSOA FÍSICA (ser humano) que receber pagamentos regulares (salários) para prestar serviços de contínuos (não eventuais), sob a orientação e dependência deste e mediante salário.
A falta de garantias trabalhistas – que não são privilégios, mas necessidades – fere a moralidade e burla o 8220;Espírito das Lei” (Montesquieu) e impede gerações de brasileiros de terem um futuro mais digno para as suas famílias. Antes da Reforma Trabalhista de 2017 havia maiores garantias para que o trabalhador não fosse explorado, mas, após a reforma, o jeitinho brasileiro permitiu que as empresas contratassem funcionais por meio de PJ (pessoa jurídica), mesmo que ele tenha o vínculo de um empregado.
Veja quais são as principais problemas dessa mudança:
- Flexibilidade de horários: enquanto um trabalhador enquadrado nas regras da CLT é cumpre o horário acordado no início da contratação, aquele que é contratado como PJ se vê obrigado a trabalhar por mais horas e tem seus horários de descanso desrespeitados, já que agora enquanto não terminar a tarefa ele não recebe seu pagamento, o que lhe rende como refém das vontades do contratante/empregador;
- Flexibilidade de projetos: enquanto um colaborador CLT, em troca de verbas rescisórias, permanece na empresa para dar treinamento àqueles que o substituirão na execução das suas tarefas e o empregador tem o tempo de 30 dias para tentar contratar outro funcionário para a mesma função, o contratado PJ pode ter sua relação de trabalho sumariamente encerrada, que pode deixar também o contratante em maus lençóis;
- Remuneração e impostos: enquanto um colaborador CLT tem em seu contracheque deduções que lhe serão retornadas em meios de benefícios como féria remuneradas, pagamento de 13º salário, Seguridade Social, universidade do atendimento médico público – entre outros -, um contratado PJ, no curto prazo, recebe mais, mas não tem o tempo contado para sua aposentadoria e não contribui para a melhoria dos bens públicos que utiliza – como o transporte coletivo, iluminação e pavimentação de vias.
Sabe-se que o modelo de trabalho como PJ confere alguns benefícios legais, mas – como se sabe – se os profissionais buscassem autonomia e flexibilidade não escolheria prestar serviços aos outros, mas sim abririam empresas e, para diminuir seus custos, escolheriam o modelo que lhes gerasse menos prejuízo – como fazem os atuais empresários que defendem a pejotização.
Afinal de contas, para o trabalhador comum que vive de salário e tem renda de alguns salários mínios, não seria melhor reverter as mudanças da pejotização e aplicar a CLT nas suas relações de trabalho?
Quais serão os efeitos de longo prazo dessa uberização do trabalho?